sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Diário de classe – I

Uma manhã de sol é um bom momento para crianças entre 10, 11 ou 12 anos ficarem no corredor, tendo a luz do sol como inspiração a reflexão e a criação. A aula em questão era de filosofia, o tema a “Mitologia Grega”, o que torna o conteúdo atraente as crianças leitores-as da nova sensação editorial, faço referência ao Percy Jackson. Inclusive, em certos momentos, preciso deixar de lado a minha monótona aula expositiva para pedir ao jovem estudante que feche o livro e preste atenção. Deixo esse assunto para outras anotações em meu diário de classe.

A primeira etapa da aula – eu fico uma hora e quarenta com a meninada - foi de mobilização, onde contei o conto “O guarda-roupas de Pandora”, escrito pelo meu amigo Alberto Ferreira, que explora o universo do menino Bernardo, sua vivência escolar e sua curiosidade com tudo que se passou milhares anos atrás. Onde o enredo tem Zeus, Prometeu, Epimeteu e Pandora. Depois do contar, ocorreu um breve debate sobre o conto, nada mais do que 10 minutos.

O momento seguinte foi de exposição do que são os mitos, da importância deles na cultura da Grécia Antiga, utilizando no preparo da aula os livros “Temas da Filosofia”, “Filosofando” e “Convite a filosofia”. O mito que utilizei foi o da Caixa de Pandora, quando Zeus, mandou aos irmãos Prometeu e Epimeteu a linda Pandora, que carregava uma caixa de onde todo o mal do mundo saiu e na terra ficou.

A curiosidade da meninada é peculiar, querendo saber se os mitos são mentiras. Uma situação chamou atenção. Quando um menino afirmou que “O mito era uma mentira”. Uma menina prontamente retrucou “Que não. Quem sabe a nossa verdade seja também uma mentira criada por nós”. Ali, entre as crianças vibrava um debate sobre a condição humana como histórica-social. Configurando um momento de impasse entre todos-as educandos-as. Eu era a fonte da certeza, o porto seguro das respostas de todos os questionamentos. Virei a cabeça, abri bem os olhos e sorri, deixei a dúvida entre todos-as.

A última etapa foi à divisão da turma em grupos. Cada grupo recebeu revistas, jornais e cartolinas. Atividade seria a produção de uma Caixa de Pandora, mas que poderia ser recriada, sendo feita uma Bolsa de Pandora, um Baú de Pandora e assim vai... As equipes deveriam procurar fotografias e ilustrações dos problemas do mundo de hoje, a escolha de cada imagem era coletiva, por isso era importante o debate entre os-as participantes da equipe, exercitando o diálogo, o pensamento e a reflexão coletiva.

Tudo corria bem, a meninada estava re-criando a Caixa de Pandora de diferentes maneiras, tinha até uma bolsa estilosa. Os debates estavam fracos, era quase comum acordo sobre os problemas no mundo, era um silêncio. Até que...

Menino I: Homossexualismo é um mal, precisa voltar a Caixa de Pandora. Mostrando a fotografia de um casal gay.

Menina I: Como assim?

Menino I: Homossexualismo não é natural.

Menina I: O que não é natural são duas pessoas se amarem e sofrerem com isso. Serem perseguidas.

Menino II: É, seu homofóbico.

Menina II: Eu tenho um tio racista, não gosto dele. Isto tudo é preconceito.

O Menino I ficou acuado, todos do grupo se portaram contra sua opinião, buscando a confirmação da sua verdade, virou a mim e perguntou.

Menino I: Professor, o homossexualismo não é natural, né?

Eu me senti inseguro. Em segundos, mas que em meus pensamentos duraram uma hora, passou que as verdades constituídas historicamente não são desmanteladas em uma única aula, que nessa faixa etária é possível começar a reconstruir um mundo, mas que ali estava em confronto um mundo cultural familiar com o mundo cultural escolar. E meu papel não seria ficar me equilibrando no muro.

Felizmente veio a lembrança Howard Zinn, que dizia a sala de aula como um espaço para a meninada sair com mais incertezas do que certezas. Falei ao garoto que o espaço da aula é para o contato com o diferente, que ao sair do Colégio procurasse observar o diferente ao seu redor, tentando entender as razões que fazem os outros serem diferentes, mesmo aquilo que não era comum até ontem, mas hoje está cada dia mais próximo dos nossos olhares.

E eu nisso tudo? Saí daquela aula com certeza de que estou no lugar certo. Acredito que o espaço escolar não é um instrumento revolucionário que vai derrubar o Estado e o capitalismo, mas ainda é um ambiente que poderá ser arejado e estimulante para quem ali passará um expressivo tempo de sua vida.

Que venham outras possibilidades de diálogos. Aqui fecho meu diário de classe.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Narrativa em Quadrinhos - II

Na noite de ontem lia "Pedro Páramo", de Juan Rulfo. Num momento deixei em pause a leitura, inspirado em meu estado de gripe, que lembra o clima da cidade de Comala, veio a minha cabeça um argumento, imediatamente mandei por emeio ao Victor Bello.


Leia mais no Frango Zine

sábado, 21 de agosto de 2010

Ao seu lado

Ao seu lado;

vou a memória de infância, daquela que sonhava transitar nos vagões do trem pintado ao redor da Igreja.

desenho o mundo, feito a mão livre nas aulas de educação artística de alguma escola do bairro.

entro no balão em pouso na pista de cross, fazendo daqui a Havana em menos de 180 dias.

é como se Exupry não tivesse confinado a rosa numa cúpula, pelo contrário, teria feito um campo de girassóis, daqueles que iluminam os sorrisos das crianças soltas na pracinha.

num domingo a risada se faz solta, feito uma jovem senhora num programa de auditório.

sento num baquinho de vime, com cinzeiro no meu colo e o cão nos seus braços.

tenho um sorriso no rosto, uma felicidade no coração e pensamentos soltos a toa.

domingo, 15 de agosto de 2010

O esquecimento

A postagem de ontem foi injusta. Ficou sem uma citação a Quino, o criador de Mafalda, a menina inquieta e terna, que foi da Argentina para os quatro cantos do mundo nos anos 1960-70, cuja atualidade ainda é sentida, basta ler.Na foto está Robee, eu e Ré, na praça Mafalda, em Buenos Aires - Argentina, no inverno de 2007.

Aproveito o meu esquecimento de ontem e encaminho a dica do Clube Mafalda e do Filmes Políticos, que tornou disponível o filme da Mafalda.

sábado, 14 de agosto de 2010

Narrativa em Quadrinhos - I

Eu nunca gostei da Mônica, era chegado no Cascão mesmo. Eu nunca gostei do Pato Donald nem do Zé Carioca, o meu esquema era o Pateta. Dos heróis, só era a minha praia o Batman. Na adolescência, graças ao Sebo, conheci a Revista Chicleta com Banana. O punk rock trouxe o Crumb. Uns amigos apresentaram Art Spiegelman, Joe Sacco e a lista vai correndo. Apesar de gostar de histórias em quadrinhos, nunca tive a manha de desenhar, só de anotar argumentos.

Pois bem, eis que o meu primeiro argumentou foi utilizado pelo Victor Bello:
Clique duas vezes para ler em maior resolução.

Leia mais produções do Victor Bello e do seu companheiro Lucas Axt no Frango zine.

domingo, 8 de agosto de 2010

Carta do tempo de infância

Querida mamãe,

Eu preciso contar um segredo.

Ontem, logo após o almoço, fui a pé até a Igreja Cristo Ressuscitado. Calma, não precisa se preocupar, correu tudo bem.

Da casa da vó passei pelo barbeiro João Careca, que me disse oi. O Juca, da mercearia, soltou o seu “Vê, vê... lá vai o neto do Walmor”. O bigodudo da padaria disse um tranquilo oi, a professora Iria, da janela da direção da Escola, sorriu pra mim. Na Rua Barra Velha o calmo senhor da casa espírita me olhou como se soubesse de todos os meus planos e preocupações, já na Rua Santa Catarina tomei cuidado ao atravessar, peguei carona com um conhecido passarinheiro da redondeza.

Na Igreja, procurei sentar nas cadeiras artesanais, atentamente olhei para o altar, de longe o Padre me olhava. Ele estava naquela sala que nunca entramos, não vestia o babador cheio de bordados, era quase um homem como o tio, se não fosse Padre, é claro.

Eu rezei um breve um pedido.

O pedido foi para a senhora nunca revelar o seu segredo, que pesa na minha vida. Mais uma vez, tenha calma. Falo sobre a origem do meu nome, já que na Escola os meus amiguinhos estão pegando no meu pé, dizendo que meu nome veio da padaria, daquela depois do Vera Cruz. Eu tenho um medo disso ser verdade.

Faça um acordo comigo, eu contei o meu segredo na carta e você nunca revele a origem do meu nome. Eu te peço, caso o meu nome venha de lá, nunca conte.

Beijinho do seu filho.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Narrativa de quem tem pressa - IV

A mãe dormiu cedo, ainda era noite de sábado. O filho minutos depois deixou um bilhete dizendo que não estaria em casa no almoço de domingo, ganhou as ruas.

O filho retornou na noite de domingo, a mãe já repousava, ao lado do rosto materno estava um livro santo. Um bilhete na porta perguntava se precisaria de café na garrafa, o filho escreveu que sim.

Um novo dia amanheceu. O filho escreveu que não estaria para o jantar de segunda-feira. A mãe chegou, tomou banho, jantou e dormiu.

Chegou a terça-feira e, lá pelas dez da manhã, o filho encontrou um bilhete que dizia “Ti amo. E não vou esperar você pra viver. Mãe

domingo, 1 de agosto de 2010

Diversidade

No domingo de hoje começa a 2ª Semana da Diversidade, organizado pela Associação Arco-íris, apoiado pela Fundação Cultural de Joinville. A programação será variada, do teatro ao cinema a palestra a Parada da Diversidade. Infelizmente não tenho tempo de ir em todas as atividades, de qualquer modo a presença vale a pena.A minha ansiedade é para assistir a fala do Luiz Mott, que é uma figura emblemática no anarquismo brasileiro, final dos anos 1970-80, quando era do jornal “O inimigo do Rei”, ao mesmo tempo pela trajetória de vida que conciliou a militância social com a vida acadêmica.